10/01/2011

Vozes do Passado

Nora Roberts

Numa tarde quente de Julho, um operário que trabalhava num estaleiro em Antietam Creek golpeia com a enxada um determinado ponto do solo - e atinge um crânio humano com cerca de 5.000 anos. A descoberta suscita de imediato curiosidade e controvérsia. E irá também mudar de forma imprevisível a vida de uma mulher...
A arqueóloga Callie Dunbrook sabe, é claro, imensas coisas a respeito do passado. Mas é o seu próprio passado que irá agora ser escrutinado e posto em causa, Escolhida por razões de competência para dirigia a estação arqueológica de Antietam Creek, ela vai aí enfrentar vários perigos - já que a sombra da morte e do infortúnio parece planar sobre aquele local, que muitos aliás dizem estar amaldiçoado. Pouco a pouco, redescobre uma paixão que pressente ser também perigosa ao ter de colaborar, nesse seu novo trabalho,com Jake Graystone, o irritante mas irresistível ex-marido. E quando finalmente uma estranha mulher a aborda, afirmando conhecer um segredo a respeito da sua infância, há questões surpreendentes e inquietantes relativas à sua própria identidade que não podem ser ignoradas.

Nora Roberts foi a primeira escritora a ser admitida no Romance Writers of America Hall of Fame. Em 1981 conseguiu publicar o seu primeiro romance, Irish horoughbred. Foi o início de uma fulgurante carreira literária. Com inúmeros prémios literários, e mais de uma centena de obras publicadas, destacamos O Pântano da Meia-Noite e Três Destinos, já publicados pela Ulisseia e incluídos na lista de bestsellers do jornal The New York Times. Os seus livros já venderam mais de 280.000.000 de exemplares em todo o mundo.

«Callie abriu os olhos quando sentiu o carro parar. Pestanejou e ficou a olhar para o campo de escavações.
— Que raios estamos a fazer aqui? Meu Deus,  certamente não é altura para trabalhar!
— Não, mas é um bom sítio. É importante recordar que este é um bom sítio. Vem comigo, Cal.
 Saiu e esperou que ela fosse juntar-se-lhe. Pegou-lhe na mão e encaminhou-se para o portão. — Achas que agora vou ficar tensa quando estiver na escavação, nervosa junto à água. 
— Não custa pôr as coisas no seu devido lugar. — Fê-la passar o portão, também. — E  tu hás-de conseguir dar a volta a isto.
— Sim, vou. E tens razão: este é um belo sítio. Um sítio importante. Também não me vou esquecer disso. 
— Tenho algumas coisas para te dizer, e a minha cabeça não está zonza.
— Está bem.
— Quero-te de volta, Callie. Como antes.
Ainda virada para o lago, moveu apenas os olhos para olhar para ele.
— Ai, sim?
— Quero-nos de volta, como éramos. Só que melhor. — Como queria ver melhor o rosto dela, estendeu a mão e meteu-lhe o cabelo atrás da orelha. — Não vou deixar -te deixar-nos partir. outra vez. Ouvi aquele tiro, vi-te cair na água. Podia ter sido o fim.
Calou-se e virou a cara. 
— Podia ter sido o fim — repetiu. — Não consigo esperar mais para resolver isto entre nós. Não posso desperdiçar mais tempo. — Virou-se para ela outra vez, os olhos cinzentos à luz difusa. O rosto grave. — Talvez eu tenha metido o pé na argola.
— Talvez?
— Tu também meteste.
As covinhas no rosto dela mexeram-se. 
— Talvez.
— Preciso que me ames da mesma maneira como me amavas antes de as coisas nos terem escapado ao controlo. 
— Isso é estúpido, Graystone.
— O diabo é que é! — Começou a empurrar Callie, mas lembrou-se do ombro dela e parou. — Não te retribuí da  forma como querias. Mas desta vez vou retribuir.
— É estúpido porque nunca deixei de te amar, seu grande idiota . Nem penses nisso! — Pôs-lhe uma mão no peito para impedi-lo de aproximar-se, quando viu o brilho nos olhos dele. — Desta vez, pede. 
— Peço o quê?
— Sabes o quê. Se me queres de volta, faz as coisas como deve ser. Põe um joelho no chão e pede.  
— Queres que me ajoelhe? — Estava sinceramente horrorizado. — Queres ver-me rastejar e implorar?
— Sim, quero. Se quero! Assume a posição, Graystone, ou vou-me embora!
— Pelo amor de Deus! — Deu meia volta, afastou-se um pouco, remoendo entre dentes.
— Estou à espera.
— Está bem, está bem. Raios! Estou a tentar.
— Esta noite levei um tiro. — Abriu e fechou as pálpebras rapidamente, quando ele voltou a olhar para ela. — Ia-me afogando. Podia ter sido o fim — acrescentou, lançando-lhe à cara as  suas próprias palavras. — E alguém está a perder tempo.
— Sempre fizeste jogo sujo. — Contrariado, voltou para trás lançando-lhe um olhar fulminante e ajoelhou-se.
— Tens de me pegar na mão e olhar para mim cheio de emoção.
— Ora, cala-te e me deixa-me fazer isto. Sinto-me um idiota. Vais casar comigo, ou o quê?
—  Isso não é maneira de perguntar. Tenta outra vez.
— Mãe de Deus! — Soprou ruidosamente. — Callie, casas comigo?
— Não disseste que me amavas. E acho que tens de dizer dez vezes cada vez que eu disser uma, durante os próximos cinco anos, para que as coisas fiquem equilibradas.
— Estás mesmo a divertir-te com isto, não estás?
— O mais possível.
— Callie, amo-te. — E o sorriso que aqueceu o rosto dela aliviou a tensão que ele sentia no peito. — Raios, amei-te assim que te vi. Apanhei um susto de morte e fiquei chateado até à medula. Não lidei bem com isso. Não lidei bem com isso porque, pela primeira vez na minha vida havia uma mulher que podia magoar-me. Que era mais importante para mim do que eu podia suportar. Isso chateou-me até à medula.
Emocionada, baixou-se para tocar-lhe no rosto.
— Pronto, já rastejaste o suficiente.
— Não, vou acabar com isto. Levei-te para a cama depressa. Achei que o fogo tinha ardido de uma vez. Mas não foi assim. Empurrei-te para o casamento. Achei que ia ficar tudo bem. Parecia lógico. Mas também não foi assim. E isso...
— Chateou-te até à medula.
— Pois chateou, caramba! Por isso meti os pés pelas mãos. Deixei-te meter os pés pelas mãos. E fui-me embora porque tinha toda a certeza de que irias atrás de mim. Mas não  foi assim. Nunca mais me vou embora. Amo a pessoa que és. Mesmo quando me deixas passado, amo a pessoa que és. Amo-te. Estou a ganhar pontos, não estou?
— Sim. — Pestanejou para afastar as lágrimas. — Estás a sair-te bem. Eu também não me vou embora, Jake. Não espero que saibas o que preciso ou o que quero. Nem vou achar que sei o que sentes ou o que pensas. Vou dizer-te. Vou perguntar-te. E vamos encontrar  o nosso caminho. 
Ela baixou-se para beijá-lo, mas quando ele começou a levantar-se, ela puxou-o para baixo outra vez.
— O que foi agora?
— Tens um anel?
— Estás a gozar comigo?
— É preciso um anel. Mas, felizmente para ti, por acaso tenho um. — Tirou o fio que trazia debaixo da camisa, pegou nele e depositou-lho na mão, juntamente com a sua aliança de casamento. 
Ele ficou a olhar, sentindo a emoção crescer dentro de si.
— Isto parece-me familiar.
— Só o tirei quando apareceste aqui. Pedi à Lana para  trazê-la, quando foi lá a casa buscar roupas secas.
Estava quente do corpo dela, e se não estivesse  já de joelhos, ver a aliança tê-lo-ia certamente feito cair de joelhos.
— Usaste isto durante o tempo todo em que estivemos separados?
— Sim. Sou uma sentimentalona.
— Mas que coincidência. — Tirou uma corrente que trazia sob a camisa e mostrou-lhe uma aliança a condizer. — Eu também. 
Ela segurou a corrente dele com força, usando-a para fazê-lo pôr-se de pé. 
— Fazemos cá um par!
Ele fechou a boca sobre a dela, com a mão fechada sobre a aliança.
— Queria provar que podia viver sem ti.
— Eu também.
— Ambos provámos que conseguíamos. Mas sou muito mais feliz contigo.
— Eu também. Oh meu Deus! — Apesar da dor no ombro,  lançou-lhe os braços à volta do pescoço. — Eu também! Desta vez, não vai ser em Las Vegas.
— Hã?
— Vamos encontrar um sítio, ter um casamento a sério. E vamos comprar uma casa.
— Vamos?
— Quero uma base. Vamos decidir onde. Quero construir um lar contigo. Um lugar onde possamos tentar ganhar raízes.
— A sério? — Ele tomou-lhe o rosto entre as mãos e depois encostou a testa à dela. — Eu também. Não me interessa onde, podemos espetar um alfinete num mapa. Mas, desta vez quero um lar. Callie, quero filhos.
— Assim é que é falar. A nossa tribo, o nosso povoado. Desta vez, vamos construir qualquer coisa. Este é um bom lugar. — Soltou um longo suspiro. — Vamos encontrar um lugar tão bom como este. Vamos encontrar o nosso lugar.
— Amo-te. — Beijou cada  uma das covinhas da cara dela. — Vou fazer-te feliz.
— Estás a fazer um bom trabalho, neste momento.
— E tu amas-me. És louca por mim.
— Parece que sim.
— Isso é bom. — Pegou-lhe na mão e regressaram ao carro. — Porque  há mais uma coisa. Sobre o casamento.
— Nada de réplicas do Elvis, nem de Las Vegas. Nem pensar! Vamos levar isto a sério.
— Absolutamente a sério. Só que o casamento é, bem... um bocado supérfluo, uma vez que continuamos casados.
Ela ficou estática.
— O que disseste?
Ele abriu a corrente e tirou de lá a aliança dela.
— Nunca assinei os papéis do divórcio. É que achei que vinhas atrás de mim, enfiar-mos pela garganta abaixo. O meu cenário era esse.
Jake abriu a corrente dele e tirou a sua aliança, enquanto ela olhava para ele, de boca aberta.
— Não assinaste os papéis? Não estamos divorciados?
— Não. Toma, põe isto outra vez.
— Só um minuto. — Fechou a mão com força. — E se eu me tivesse apaixonado por outra pessoa, tivesse querido casar com outra pessoa?
— Eu tinha-o morto e enterrado em uma campa rasa. E ter-te-ia consolado. Vá lá, Cal, deixa -me voltar a pôr-te isto no dedo. Quero ir para casa, dormir com a minha mulher.
— Achas que isto tem muita graça, não achas?
— Bem, acho. — Lançou-lhe aquele sorriso breve e deslumbrante. — Tu não?
Ela cruzou os braços e semicerrou os olhos. Bateu com o pé no chão. Ele continuou a sorrir.
Depois estendeu a mão.
— Tens sorte por o meu sentido de humor ser tão estranho como o teu. »


1 comentário:

  1. Adorei este livro!Só tenho uma coisa a apontar...quero um Graystone só para mim!!!! xD

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